Termalismo Social e Crenoterapia no SUS: Práticas Integrativas para a Promoção da Saúde

 


O cuidado integral à saúde vem se ampliando com a valorização de práticas integrativas e complementares que consideram o ser humano em sua totalidade — física, mental, emocional, social e espiritual. Entre essas práticas, o Termalismo Social e a Crenoterapia têm se destacado como abordagens terapêuticas que utilizam as propriedades das águas minerais, termais e do mar para a prevenção e tratamento de diversas condições de saúde. Com respaldo da Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares (PNPIC), essas técnicas vêm ganhando espaço no Sistema Único de Saúde (SUS) como estratégias acessíveis, sustentáveis e baseadas em saberes tradicionais.

Este artigo aborda o conceito de termalismo social, sua inserção nos sistemas de saúde de diferentes países, as experiências brasileiras, os desafios e as possibilidades de implementação em nível municipal e estadual.


1. O Que é Termalismo Social?

O termo "Termalismo Social" refere-se ao uso terapêutico das águas minerais, termais ou do mar no âmbito dos sistemas nacionais de saúde e proteção social, permitindo o acesso equitativo da população a tratamentos naturais com foco na reabilitação, prevenção de doenças, bem-estar e promoção da saúde.

É importante não confundir o termo com atividades de lazer, banhos estéticos ou práticas privadas de SPA. O termalismo social tem um caráter público, preventivo, terapêutico e integrativo, sendo estruturado como política de saúde pública em diversos países.


2. Crenoterapia: O Coração Terapêutico do Termalismo

A crenoterapia é o tratamento que utiliza águas minerais naturais (quentes ou frias) com propriedades físico-químicas específicas, aplicadas por diversas vias: imersão, ingestão, inalação, duchas, nebulizações, irrigação ou compressas. Pode também incluir o uso de pelóides (lama termal), vapores e outras formas.

Entre os efeitos terapêuticos da crenoterapia estão:

  • Melhora da circulação sanguínea

  • Redução de dores musculares e articulares

  • Alívio de doenças respiratórias

  • Regulação das funções digestivas e metabólicas

  • Equilíbrio do sistema nervoso

  • Reforço da imunidade


3. Termalismo Social e Sistema de Proteção Social

O Sistema de Proteção Social está diretamente ligado ao conceito de cidadania e às formas pelas quais uma sociedade garante apoio e segurança aos seus indivíduos diante de situações de vulnerabilidade — como doenças, desemprego, pobreza, exclusão social e envelhecimento. O termalismo social, portanto, é uma expressão concreta desses direitos, permitindo que mesmo pessoas de baixa renda tenham acesso a práticas terapêuticas eficazes e de baixo custo.


4. Modelos Internacionais de Inserção do Termalismo

O termalismo é amplamente praticado em diversos países da Europa e Ásia. A forma de inserção dessas práticas nos sistemas de saúde varia significativamente:

  • França, Itália e Turquia: oferecem um tratamento termal por ano ao usuário do sistema público.

  • Bulgária, Hungria, Letônia e Islândia: o intervalo entre os tratamentos é definido segundo indicação médica.

  • Luxemburgo, Alemanha, Portugal e Espanha: têm o termalismo inserido como prática de medicina complementar com reembolso total ou parcial.

  • Em alguns países, o termalismo é voltado apenas para lazer e não integra o sistema de saúde.

  • Em outros, o balneário pode ser escolhido pelo paciente mediante prescrição, respeitando critérios médicos e administrativos.


5. O Termalismo Social no Brasil

No Brasil, o uso terapêutico das águas minerais remonta aos povos indígenas, que já conheciam e utilizavam fontes naturais para diversos tratamentos. Com a colonização portuguesa, o termalismo médico passou a ser utilizado de forma mais sistemática. No entanto, foi com a criação do SUS e da Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares (PNPIC) que o Termalismo Social começou a ganhar contornos de política pública.

A inclusão oficial no SUS foi feita pela Portaria Ministerial nº 145 de 2017, que reconheceu o Tratamento Termal/Crenoterápico como procedimento da Atenção Primária à Saúde, legitimando e estruturando sua oferta no serviço público.


6. Práticas Termoterápicas na Atenção Básica

Mesmo em municípios que não possuem fontes termais naturais, é possível desenvolver práticas baseadas nos princípios do termalismo. Algumas opções viáveis são:

  • Nebulizações com águas minerais específicas

  • Duchas e compressas terapêuticas

  • Imersões parciais com água aquecida

  • Ingestão orientada de água mineral

  • Geoterapia com argilas e pelóides naturais

  • Hidroterapia de Kneipp: alternância de banhos quentes e frios em partes do corpo, com efeito estimulante e regulador

Estas práticas são adaptáveis à realidade das Unidades Básicas de Saúde (UBS) e podem ser realizadas com infraestrutura simples, promovendo bem-estar com baixo custo.


7. Desafios e Potencialidades no SUS

Desafios:

  • Financiamento: Recursos específicos são necessários para implementação e manutenção das práticas.

  • Formação profissional: Há carência de profissionais capacitados em termalismo e crenoterapia.

  • Legislação: A regulamentação precisa ser ampliada e fortalecida.

  • Infraestrutura: Muitos municípios ainda não têm locais adequados ou equipamentos mínimos.

  • Sensibilização dos gestores: Ainda há desconhecimento sobre a eficácia e aplicabilidade das práticas.

Potencialidades:

  • O Brasil possui uma grande disponibilidade de águas minerais e do mar, o que oferece amplo potencial para expansão.

  • O uso de aquecimento solar pode viabilizar o tratamento com águas frias.

  • A crenoterapia pode descongestionar serviços especializados, promovendo saúde na base da pirâmide.

  • Pode fortalecer o turismo de saúde e o desenvolvimento sustentável local.


8. Hidroterapia de Kneipp como Terapia Complementar

Uma forma simples de introduzir práticas do termalismo é por meio da Hidroterapia de Kneipp, um método tradicional que alterna aplicações de água fria e quente em diferentes partes do corpo.

Essa técnica:

  • Estimula a circulação sanguínea

  • Melhora o funcionamento intestinal (útil em casos de constipação e flatulência, como o do Sr. António)

  • Reforça o sistema imunológico

  • Pode ser aplicada em casa com orientação de profissionais da saúde, inclusive Agentes Comunitários de Saúde (ACS)


9. Inserção Local: Caminhos para Municípios e Estados

Mesmo sem fontes termais, os municípios podem incorporar elementos do termalismo por meio de:

  • Capacitação de equipes da Atenção Básica

  • Parcerias com universidades e instituições técnicas

  • Implantação de espaços de cuidado integrativo nas UBS

  • Fomento a projetos de turismo de saúde

  • Elaboração de políticas públicas municipais voltadas à promoção do bem-estar

Os estados podem criar programas regionais de termalismo social, especialmente em áreas com fontes naturais, associando saúde, turismo e economia local.


Conclusão

O Termalismo Social e a Crenoterapia oferecem uma abordagem promissora para o fortalecimento da saúde coletiva, respeitando saberes tradicionais e ampliando o acesso a terapias naturais. Sua inserção no SUS é não apenas viável, mas necessária diante da crescente demanda por práticas integrativas, sustentáveis e de baixo custo.

Com investimento, formação adequada e fortalecimento de políticas públicas, o Brasil pode se tornar referência mundial na integração entre saúde, natureza e bem-estar — com águas que curam, acolhem e transformam vidas.

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