Quando a Perda de Memória Pode Ser Preocupante: Um Olhar Terapêutico

 


Esquecer onde deixou as chaves, o nome de uma pessoa que acabou de conhecer ou uma tarefa do dia a dia é algo comum a todos nós. Afinal, o cérebro está constantemente processando uma grande quantidade de informações, e é natural que algumas delas “escapem”.

No entanto, quando esses esquecimentos se tornam frequentes, começam a afetar a rotina ou causam sofrimento, é hora de acender um sinal de alerta.

Quando a perda de memória deixa de ser um esquecimento pontual e passa a interferir no bem-estar e na funcionalidade da vida, ela se torna um tema terapêutico importante.

Neste artigo, vamos explorar:

  • Os tipos de memória e como funcionam

  • Diferença entre esquecimentos comuns e sinais de alerta

  • Fatores psicológicos e emocionais que afetam a memória

  • Quando procurar ajuda

  • Abordagens terapêuticas para cuidar da saúde mental e cognitiva


Como a memória funciona?

A memória não é uma "caixa de armazenamento" única no cérebro, mas um sistema complexo com diferentes tipos e etapas.

Principais tipos de memória:

  1. Memória de curto prazo:
    Armazena informações temporárias (por exemplo, um número de telefone que acabamos de ouvir).

  2. Memória de trabalho:
    Relacionada ao raciocínio e manipulação de dados em tempo real (por exemplo, fazer um cálculo mental).

  3. Memória de longo prazo:
    Armazena informações por dias, anos ou toda a vida, incluindo memórias autobiográficas e conhecimentos adquiridos.

  4. Memória episódica:
    Ligada a eventos vividos, como o que você comeu ontem ou sua última viagem.

  5. Memória semântica:
    Relacionado ao conhecimento do mundo, como fatos, nomes, datas e conceitos.


Esquecimentos normais x perda de memória preocupante

Esquecimentos comuns (não preocupantes):

  • Esquecer onde colocou objetos pontualmente

  • Esquecer nomes e lembrar depois

  • Entrar em um cômodo e esquecer o motivo

  • Dificuldade de lembrar datas específicas sob estresse

Esses lapsos são geralmente causados por distração, cansaço, sobrecarga de estímulos ou estresse emocional.

Sinais de alerta:

  • Dificuldade frequente em lembrar informações recentes

  • Repetir perguntas várias vezes no mesmo dia

  • Esquecer nomes de pessoas próximas ou familiares

  • Desorientação no tempo ou espaço (não lembrar onde está ou que dia é)

  • Esquecer como realizar tarefas rotineiras

  • Dificuldade em seguir conversas ou raciocínios simples

  • Mudanças abruptas de humor associadas à confusão

  • Negação ou irritação diante da sugestão de que algo está errado

Quando esses sinais se tornam recorrentes, é importante investigar com profissionais da saúde.


Causas possíveis da perda de memória

1. Fatores emocionais e psicológicos

  • Ansiedade: estados ansiosos constantes comprometem a concentração e dificultam a consolidação da memória.

  • Depressão: a lentificação cognitiva típica da depressão pode afetar gravemente a atenção e a memória de curto prazo.

  • Estresse crônico: o excesso de cortisol afeta negativamente o hipocampo, região do cérebro essencial para a memória.

  • Transtornos de trauma: pessoas que viveram experiências traumáticas podem apresentar bloqueios de memória ou lapsos.

Atenção terapêutica: Muitas vezes, a perda de memória não tem origem neurológica, mas emocional. Por isso, o acolhimento psicoterapêutico é essencial.

2. Uso de substâncias

  • Álcool em excesso

  • Benzodiazepínicos e outros medicamentos

  • Drogas ilícitas

  • Uso prolongado de medicamentos sedativos

3. Distúrbios neurológicos e doenças cognitivas

  • Alzheimer e outras demências

  • Lesões cerebrais

  • AVC

  • Déficits cognitivos leves (que podem evoluir)

4. Fatores fisiológicos e hormonais

  • Distúrbios da tireoide

  • Deficiências nutricionais (como B12 e ácido fólico)

  • Distúrbios do sono (como apneia)

  • Menopausa (em mulheres, pode causar névoa mental)


O impacto emocional da perda de memória

Perceber que a memória está falhando frequentemente gera:

  • Medo de estar “enlouquecendo”

  • Vergonha de admitir dificuldades

  • Isolamento social por insegurança

  • Ansiedade antecipatória ("e se eu esquecer de novo?")

  • Crises de identidade ("quem sou eu se não consigo confiar na minha mente?")

Nesses momentos, o apoio psicológico é fundamental para acolher o sofrimento, desfazer crenças catastróficas e propor estratégias práticas.


O papel da terapia na perda de memória

1. Terapia Cognitivo-Comportamental (TCC)

Ajuda a identificar os pensamentos disfuncionais relacionados ao medo de esquecer e propõe novas formas de lidar com os lapsos de memória.

Exemplo:
Pensamento disfuncional: “Estou com Alzheimer.”
Reestruturação cognitiva: “Estou passando por muito estresse, o que pode afetar minha atenção. Vou buscar apoio.”

2. Terapia de Estimulação Cognitiva

Foca em exercícios mentais e rotinas para fortalecer áreas da memória, linguagem e raciocínio.

3. Mindfulness e técnicas de atenção plena

Reduzem a dispersão mental e melhoram a concentração, fundamentais para memorizar informações.

4. Psicoterapia humanista ou psicodinâmica

Apropriadas quando a perda de memória está ligada a traumas emocionais ou bloqueios inconscientes.


Quando procurar ajuda profissional?

Consulte um psicólogo, psiquiatra ou neurologista se:

  • Os esquecimentos interferem no seu trabalho, estudos ou rotina doméstica.

  • Você está evitando situações sociais por insegurança.

  • Outras pessoas notaram mudanças na sua memória.

  • Você está angustiado ou deprimido por não conseguir confiar na sua mente.

  • Existe histórico familiar de Alzheimer ou outras demências.

Quanto mais cedo for investigado, melhores as chances de tratamento e reversão de causas emocionais ou clínicas.


Estratégias terapêuticas para o dia a dia

  • Faça listas e anotações — o cérebro não precisa decorar tudo.

  • Crie rotinas — elas ajudam a fixar hábitos e memórias.

  • Durma bem — o sono é essencial para consolidar lembranças.

  • Pratique exercícios físicos — melhora a oxigenação cerebral.

  • Evite multitarefas excessivas — foco é melhor que pressa.

  • Busque hobbies que desafiem o cérebro: leitura, jogos, música, escrita, aprendizado de novas línguas.


Considerações finais

A perda de memória não é sempre um sinal de doença grave, mas nunca deve ser negligenciada quando começa a afetar a qualidade de vida.
Mente e corpo estão profundamente conectados. Muitas vezes, ao cuidar da saúde emocional, a memória se reequilibra.

Permita-se buscar ajuda.
A memória pode falhar…
Mas o cuidado com você mesmo não precisa falhar junto.


Sugestões de leitura e aprofundamento

  • O Cérebro Autista — Temple Grandin

  • A Cabeça Bem-Feita — Edgar Morin

  • Alzheimer e outras Demências — José Luiz de Sá Cavalcanti

  • Mindfulness: Atenção Plena — Mark Williams e Danny Penman

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